segunda-feira, 27 de junho de 2016

A principal lição

A principal lição da magistratura presidencial de Ramalho Eanes, sobre cuja eleição passam hoje 40 anos, foi o lema da sua candidatura e da sua ação em Belém, ou seja, "um presidente para todos os portugueses".
É certo que era esse o entendimento da função presidencial que decorre da Constituição e que se impunha a um candidato saído das forças armadas. Mas a expressa adoção desse lema cortou à nascença as veleidades de apropriação partidária da eleição presidencial, copiando a noção francesa da "maioria presidencial" contraposta à maioria parlamentar. Tivesse essa tentativa vingado, a sorte do regime democrático entre nós poderia ter sido bem mais complicada, instável e conflitual do que foi ao longo destas quatro décadas.
Para além de ter presidido com prudência e equilíbrio à transição da revolução de 1974 para a ordem constitucional de 1976, devemos a Ramalho Eanes essa virtuosa formatação independente e apartidária do mandato presidencial, que abriu caminho à consolidação da democracia parlamentar em Portugal (e que nem o mal-avisado envolvimento na aventura do PRD no final do seu segundo mandato afetou).

Adenda
O discurso de Marcelo Rebelo de Sousa na homenagem a Ramalho Eanes, hoje na Fundação Calouste Gulbenkian, merece ser louvado, pelo conteúdo e pela eloquência.

União de conveniência

Para o bem e para o mal, a posição face à União Europeia - e o que lhe vem associado, em matéria de política económica, de disciplina orçamental e de política externa e de defesa - é entre nós o grande divisor da geografia partidária.
A posição dos partidos da protocoligação governamental face ao Brexit - com o PS a reiterar sem margem para dúvidas a sua fidelidade à UE, como lhe competia, e os partidos da extrema-esquerda a celebrarem a saída britânica e a defenderem expressa ou implicitamente igual solução para Portugal - vem lembrar aos esquecidos que a atual solução governativa é uma união de facto de conveniência, em que a extrema-esquerda parlamentar só tem um pé dentro e que só "engole" enquanto ela for pagante. Resta saber até quando pode durar uma aliança governamental baseada em tão notória inconsistência de fundamentos políticos e doutrinários.

Desimpasse

1. As eleições parlamentares espanholas ficaram marcadas pela derrota da aliança da extrema-esquerda Podemos/Esquerda Unida (pela qual o Bloco espanhol fagocitou o que restava do PCE), que desceu em relação às eleições de dezembro passado e perdeu a aposta em ultrapassar o PSOE.
Foi um enorme tiro pela culatra depois de o Podemos ter inviabilizado o Governo PSOE-Ciudadanos e ter provocado novas eleições, tanto mais que estas resultaram num reforço da votação do PP.

2. Tendo ficado de lado a hipótese com que a esquerda radical sonhava, de uma maioria de esquerda liderada pelo Podemos - que seria humilhante e intragável para o PSOE -, fica também fora da agenda a repetição de uma coligação PSOE-Ciudadanos, visto que ambos perderam posições em relação a há seis meses.
De acordo com as regras da democracia parlamentar, o PP deve ser chamado a formar governo, como partido mais votado, aliás com uma posição reforçada em relação às anteriores eleições. E o PSOE só poderia chumbar esse governo se pudesse formar uma maioria de governo alternativa, como sucedeu em Portugal, o que não é o caso em Espanha.
O mais provável, portanto, para superar o impasse governativo espanhol é um governo minoritário do PP, eventualmente em coligação com o Ciudadanos e algum partido autonomistaficando o PSOE a liderar a oposição.

sábado, 25 de junho de 2016

Governo da CGD

Este é o lead da minha coluna desta semana no Diário Económico digital. Sobre o novo sistema de governo empresarial da CGD.

Esperar para ver

O apuramento do défice orçamental do primeiro trimestre deste ano em 3,2% do PIB, dois pp abaixo do défice homólogo em 2015, deixou o Governo satisfeito. Oxalá tenha razão para isso!
Todavia, é de ter em conta que: (i) os números dizem respeito apenas ao primeiro trimestre, antes da entrada em vigor do orçamento para 2016; (ii) há indícios de abrandamento da retoma económica, o que pode afetar o crescimento das receitas públicas; (iii) uma das principais razões da descida do défice em relação ao ano anterior foi a abrupta queda do investimento público, o que não parece ser motivo de satisfação.
Em conclusão, creio que a meta de 2,2% para o saldo das contas públicas este ano (e de corte no défice estrutural) continua em dúvida e que só lá para Outubro é que se pode ter uma ideia mais clara sobre o assunto.

sexta-feira, 24 de junho de 2016

Dia triste para a UE

Como sucede por vezes nos referendos, a emoção levou a melhor sobre a razão.  A saída britânica não faz rejubilar somente as forças antieuropeias na extrema esquerda e na extrema direita, mas também outras paragens, como em Moscovo ou em Pequim, que beneficiam do enfraquecimento da UE
Agora é preciso cabeça fria em Bruxelas e demais capitais europeias e inteligência e determinação para retomar o caminho da União Europeia numa nova base, respondendo aos fatores que ajudaram ao desenlace britânico.
A integração europeia começou sem os britânicos. Nunca conseguiu fazer deles membros a 100%. Vai ter de prosseguir sem eles.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Against Brexit: "We have far more in common than which divides us!"



The threat of Brexit - I sincerely hope the British people do not let it materialise tomorrow - calls upon us to move forward in deepening European integration. We need to step up and fight against Europe's neo-liberal austerity that created insecurity by destroying jobs and aggravating inequalities, and to fight against Fortress Europe that cruelly closes borders to those who beg for protection. Isolationism, intolerance and exclusion will only feed radicalisation and escalation of terror in our societies and globally.

This referendum is far from being just about the UK in the EU and it is far from being just about the UK: it deeply affects Europe as a whole and will have repercussions worldwide. That is why I was in Norfalk this weekend, with my Labour MEP colleague Richard Howitt, to support the IN campaign: I believe that we need a more united, solidary and democratic Europe and for that we must have the UK’s contribution: a pro-European UK can be crucial to make the changes the EU so badly needs.

There are many British young people who do not conceive a future without the European Union. They went on Erasmus and volunteering programs abroad, they were not forced to go to war, they study and work with colleagues from different nationalities, they travel and feel first-hand the benefits of being part of a Union that brought peace to a Europe tormented by centuries of wars. The result of the referendum will depend, to a great extent, on these young people not staying at home today and showing in the polls a UK that does not give up on the EU, but instead pushes towards the reforms needed and helps making it stronger and more effective in the global regulation.

I am, on my own, very critical of the EU. Constructively critical: I strongly feel that the EU needs reforms in both its structure and policies, and push daily for more democracy, more transparency, more accountability, more coherence and more effectiveness.

It is important to recognise that, in several aspects, we are quite far from living up to our European project and values. We also need to acknowledge that the dissatisfaction and mistrust felt by many citizens will not come to an end tomorrow, whatever the result. We need to get rid of the neo-liberal deregulation policies which created unemployment, social exclusion, inequalities and injustices, and explain the political resentment and the feeling of insecurity felt today by large sectors of our societies. People who may be  instrumentalised ​​by xenophobic and intolerant populism and radicalism,  which are pushing many into violent extremism and even terrorism.

Disunity and distrust have been prevailing too often, because we failed in promoting solidarity and tolerance. Hatred and the extreme right propaganda have already made victims, as the brutal murder of MP Jo Cox tragically illustrates.

This referendum may be, above all, about the kind of society British people want to live in. Whatever the outcome, we need to use it as the decisive impulse for all of us, Europeans, to move ahead towards a more just society and a rules-based world we want to live in, in peace. For that we need to enforce the words Jo Cox was never afraid of using: “We have far more in common than which divides us”.


Ana Gomes, MEP

 

Contra o Brexit: fiquem e ajudem mudar a União!


A ameaça de Brexit - que eu espero que o povo britânico não deixe concretizar-se - convoca-nos para avançar no aprofundamento da integração europeia. Contra a Europa da austeridade neo-liberal que semeou insegurança ao destruir emprego e extremar desigualdades. Contra a Europa fortaleza que desumanamente fecha fronteiras a quem pede proteção. Isolacionismo, intolerância e exclusão só alimentam radicalização e conflito nas nossas sociedades e globalmente. 

O referendo de hoje está longe de ser apenas sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia e, acima de tudo, de ser apenas sobre o Reino Unido: afecta toda a Europa e terá repercussões por todo o mundo. Por isso estive no passado fim-de-semana em Norfolk, a acompanhar o meu colega trabalhista Richard Howitt na campanha contra o "Brexit": acredito que o futuro da Europa  - uma Europa mais unida, mais solidária e mais democrática - precisa da contribuição do Reino Unido. E que um Reino Unido pró-europeu pode ser determinante para fazer na União Europeia as mudanças de que ela tanto precisa.

Muitos são os jovens britânicos que não concebem um futuro sem União Europeia. Fizeram Erasmus e voluntariado fora, não foram obrigados a partir para a guerra, estudam e trabalham com colegas de várias nacionalidades, viajam e sentem na pele as vantagens de fazer parte de uma União que trouxe a paz a uma Europa martirizada por séculos de guerras. O resultado do referendo dependerá, em grande medida, de estes jovens não ficarem hoje em casa e mostrarem nas urnas um Reino Unido que não abandona a União, antes deseja reformá-la, torná-la mais forte e eficaz na regulação global.

Sou a primeira a defender que a UE precisa de reforma na sua estrutura e nas suas políticas - e por isso sou construtivamente muito crítica e me bato diariamente por mais democracia, mais transparência, mais responsabilidade, mais coerência e mais eficácia. É importante reconhecer que a União se afastou perversamente do projecto e dos valores fundacionais em muitos aspectos. E que o descontentamento e a desconfiança que suscita hoje em muitos cidadãos não acabará amanhã, seja qual for o resultado na Grã-Bretanha. As políticas de desregulação neo-liberal criaram desemprego, exclusão, desigualdades e injustiças que explicam o ressentimento político e o sentimento de insegurança instalados em amplos sectores das nossas sociedades, contamináveis e instrumentalizáveis por discursos populistas xenófobos e intolerantes e por radicalismos que podem resvalar para o extremismo violento e até para o terrorismo. Deixámos instalar desunião e desconfiança, em vez de promovermos solidariedade e tolerância. E o ódio e a extrema direita fazem vítimas, como o brutal assassinato de Jo Cox tragicamente ilustra.

Este referendo será sobre a sociedade em que querem viver os britânicos. Importa fazer dele, qualquer que seja o resultado, impulso determinante do que queremos nós todos, europeus, sobre a sociedade e o mundo em que vamos viver. Importa fazer valer as palavras que Jo Cox não se amedrontava de usar: "Temos muito mais em comum do que aquilo que nos divide"!



Prevenção da radicalização

 "O Parlamento aprovou em Novembro um relatório sobre este tema, em que a par de confiança, cooperação, coordenação, partilha de informação entre forças de segurança, de inteligência e outras autoridades europeias, apontámos a urgência de medidas de prevenção da radicalização, nas prisões e nos ghettos, como Molenbeek, por essa Europa fora.

Mas em vez disso, acabámos com um PNR europeu - enganadoramente acenado aos cidadãos como bala mágica contra o terrorismo - esburacado quanto a voos charters e privados, ilustrando a inconsistência de políticas ditas securitárias que realmente não dão segurança nenhuma. E nem vou falar no financiamento do terrorismo que prossegue através dos nossos bancos e sistemas financeiros...

Acresce que continuamos a pagar o preço da falta de Europa e, portanto, de falta de coerência entre segurança interna e acção externa, com descoordenação, inacção e contradições face a conflitos na Síria, Iraque, Líbia, Turquia, Ucrânia e outros na nossa vizinhança.

A nossa segurança depende também de um combate ideológico e político dentro e fora das nossas fronteiras: mas não saberemos travá-lo se continuarmos a deixar espaço para que a extrema-direita fascista e nazi insufle os ventos da xenofobia e do ódio contra refugiados e migrantes. E se continuarmos em negação falando de "foreign fighters" quando são, na verdade, jovens europeus, nascidos e criados e empurrados para a pequena criminalidade e as prisões nos nossos Estados Membros, quem nos tem atacado, como atacam outros povos integrando as fileiras do Daesh, porque alimentam ressentimentos contra as sociedades em que cresceram, sentindo-se excluídos e discriminados.

Falta aos nossos governos no Conselho e à Comissão reconhecer que as políticas neo-liberais falharam miseravelmente e fomentaram insegurança e populismos na Europa ao criar desemprego, ghettos, exclusão, desigualdades e injustiça social. Criaram condições para o chamado "Estado Islâmico" ou grupos de hooligans nazi-fascistas transformarem jovens europeus em lobos assassinos. Foram estas mesmas políticas de austeridade que cortaram em capacidades e no treino das nossas forças de defesa e de segurança e nas capacidade de reabilitação nas nossas prisões, deixando que se transformassem em centros de radicalização. Sem nunca investirmos realmente em programas de prevenção da radicalização e de desradicalização.

A Comissão põe finalmente a tónica na prevenção da radicalização. Para isso precisamos de políticas sociais inteligentes que envolvam estruturas municipais e nacionais, escolas, clubes, organizações não-governamentais, sector privado, e que impliquem activamente as famílias e as comunidades religiosas, em especial as muçulmanas europeias, que sofrem a dobrar o efeito devastador de cada ataque e do recrutamento terrorista.

É crucial impedir reacções de vista curta, como as que sugerem a retirada de nacionalidade a suspeitos de terrorismo ou a criminalização do uso da Internet. Importa é usar a internet e outros meios em programas de contra-propaganda eficazes, que não instiguem obscurantistas como os que assassinaram Jo Cox ou massacraram em Orlando, Paris, Bruxelas, Alepo, Instambul ou Tripoli."


(Minha intervenção em debate no plenário do PE ontem sobre "Prevenção da radicalização que leva ao extremismo violento e ao terrorismo" - que não consegui ler até ao fim, apesar de estar farta de saber que 2,5 minutos de texto levam muito mais tempo a ler em português que em inglês...)

 

Voltar ao mesmo?

O Público informa que a ADSE admite vir a beneficiar de novo de financiamento orçamental.
Não é de aplaudir tal reversão quanto ao modelo de financiamento desse serviço, não havendo nenhuma razão para que os contribuintes, que já pagam o SNS universal, subsidiem também um serviço de saúde privativo dos funcionários públicos.

terça-feira, 21 de junho de 2016

Ir ao bolso da ADSE


Por esquecimento, só hoje registo aqui a minha coluna da semana passada no Diário Económico digital. Sobre como a Madeira se locupleta à custa da ADSE.

Alhos com bugalhos


Esta manchete da última edição portuguesa do Monde Diplomatique mostra em todo o seu esplendor a salgalhada ideológica de que é capaz a extrema-esquerda.
De facto, só eles são capazes de meter no mesmo saco os "contratos de associação", pelos quais os colégios privados assaltam o orçamento do Estado à custa das escolas públicas, e as universidades-fundação, que são somente uma alternativa facultativa de governo e gestão das universidades públicas, permitindo-lhes uma gestão financeira, contabilística e orçamental segundo as regras de direito privado (como acontece, aliás, há muito com os hospitais do SNS), mas que continuam a ser instituições públicas para todos os efeitos.
Considerar que as universidades-fundação públicas - que foram admitidas no RJIES de 2007 elaborado pelo Ministro J. Mariano Gago num Governo socialista e que o Governo PSD/CDS tentou extinguir logo a seguir - são um exercício de "neoliberalismo" não é apenas uma provocação conceptual, é também uma falsificação política e ideológica.

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Gostaria de ter escrito isto

«É uma pena que a campanha pela permanência [do Reino Unido na UE] tenha perdido tanto tempo concentrada nos benefícios económicos da adesão à UE. A UE é, naturalmente, uma construção económica. Mas fazer parte da UE não tem fundamentalmente que ver com economia. Tem que ver com o nosso modo de vida.»
(Wolfgang Muenchau, "Os valores europeus são mais importantes do que os económicos", no Diário de Notícias de hoje)

Mais TTIP

Amanhã vou estar aqui, a intervir neste debate sobre o TTIP, promovido pela comissão concelhia do PS de Lisboa.


Voltar ao mesmo?


1. Este quadro, copiado do Diário Económico, mostra os níveis de consumo dos países da UE em paridade de poder de compra (PPC), em percentagem da média europeia. No canto inferior esquerdo estão os níveis comparados de PIB per capita em percentagem da média europeia. Números relativos a 2015.
Verificamos que Portugal, com um PIB de apenas 77% da média europeia, exibe 83% do consumo. Mesmo se aquém da diferença da Grécia (71% de PIB contra 81% de consumo!), Portugal compara mal com a Espanha (92% de PIB contra 88% de consumo) e fica a léguas da Irlanda (145% de PIB contra 95% de consumo).

2. Calcula-se que, embora esteja longe de recuperar o PIB de antes da crise, Portugal já recuperou os níveis de consumo anteriores.
O reverso da medalha está na taxas de crescimento. Embora Portugal esteja a crescer mais do que a Grécia, fica muito aquém da pujança da Espanha ou da Irlanda. Onde se consome demais, há poupança e investimento de menos. E a economia e o emprego é que pagam. 
Nisto não há milagres...

Conúbio

Lê-se na página oficial da Presidência da República que o PR participou na "peregrinação militar nacional a Fátima" e que «enquanto Comandante Supremo das Forças Armadas, Marcelo Rebelo de Sousa participou na Eucaristia, na Basílica da Santíssima Trindade».
É evidente que, enquanto cidadãos, os militares e o Presidente da República podem participar em qualquer peregrinação ou cerimónia religiosa, mas não na qualidade oficial de chefes militares, muito menos na qualidade constitucional de comandante supremo das Forças Armadas.
Mais de quatro décadas depois do fim da ditadura e entrada em vigor da Constituição de 1976, que estabeleceu enfaticamente a separação entre o Estado e a religião, prossegue alegremente o conúbio entre o poder político e a Igreja Católica, sob o alto patrocínio do próprio Presidente da República. Como se nada tivesse mudado desde 24 de abril de 1974. 
Lamentável!

domingo, 19 de junho de 2016

Autonomia e avaliação das universidades

Na próxima terça-feira vou falar nesta conferência:


Multidão

Não consigo compreender o aumento em quase um terço do número de administradores da CGD (de 14 para 19 membros). 
É certo que os bancos privados têm “boards” ainda maiores, mas aí a razão está na existência de vários acionistas de referência, que têm de estar representados no conselho; no caso da CGD só há um acionista. Também é verdade que o número de membros deve ser suficientemente amplo para que os administradores não executivos sejam mais do que os executivos, mas isso não exige um tão grande número global. Havendo atualmente sete membros executivos, bastaria que o conselho tivesse 15 membros para cumprir a regra da maioria de não executivos.
[revisto]

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Inquérito

Não percebo a oposição ao inquérito parlamentar à gestão política e empresarial da CGD que levou à problemática situação atual do banco público.
Invocar a "instabilidade" que o inquérito criaria à instituição é pôr as coisas de pernas para o ar. O que causa nervosismo público e instabilidade na instituição é não se perceber como é que se chegou aqui e quem foram os responsáveis.

Adenda
Causa perplexidade ver entre os opositores ao inquérito dois antigos ministros das finanças, que tiveram a tutela da CGD. Pois não é evidente que deviam ser os primeiros a apoiar a ideia, até como prova de que não têm nada a temer!?

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Hediondo

Tal como todos os crimes políticos, também é hediondo o assassínio da deputada trabalhista Jo Cox, em campanha pela permanência da Grã-Bretanha na UE. Ele mostra o ódio irracional que pode gerar a demagogia populista.  Que ao menos este estúpido crime sirva para abrir aos olhos aos britânicos iludidos pela retórica nacionalista anti-europeia.

Adenda
Sobre a deputada assassinada ver este tocante editorial do The Guardian.

quarta-feira, 15 de junho de 2016

TTIP

Hoje vou estar num debate promovido pelo grupo parlamentar do PS sobre o acordo comercial e de investimento em negociação entre a UE e os EUA (conhecido pela sigla TTIP).
Conhecida a atávica oposição da extrema-esquerda a qualquer acordo de comércio internacional da UE, para mais envolvendo os EUA, é importante conhecer a posição do PS em relação às negociações do TTIP, que aliás estão longe de chegar ao fim.

Irresponsabilidade básica incondicional

Continua a correr em Portugal e noutros países da UE uma petição para a criação de um rendimento básico incondicional (RBI), de âmbito universal. Ou seja, um rendimento mínimo garantido para toda a gente e sem exclusões nem condições.
Se o tal RBI tivesse o modesto valor de 5 000 euros por ano, o seu custo, multiplicado por mais de 10 milhões de portugueses, iria para cima de 50 000 milhões de euros por ano! Onde é que se iria buscar esse dinheiro, eis a pergunta de mil milhões
Parece que em Portugal o número de assinantes já vai em mais de 5 000. Como é que neste pais e neste momento há tantos cidadãos que assinam uma proposta política e financeiramente tão irresponsável, isso ultrapassa qualquer explicação racional.
Há pouco tempo, os suíços rejeitaram em referendo essa proposta. Desconfio que em Portugal, se tal referendo fosse possível (felizmente, não é!), ele seria aprovado!
[revisto]

Adenda
Pergunta um leitor porque é que não pode haver referendo sobre essa matéria em Portugal. A resposta é: porque a Constituição sensatamente exclui referendos sobre matérias de incidência orçamental, fiscal ou financeira. Ainda bem!

terça-feira, 14 de junho de 2016

Nada de bom

A afirmação de que o "Brexit assusta a Europa" descreve bem a situação criada pela crescente sensação de que o referendo sobre a saída britânica da UE pode vir a vencer.
Mas se os europeus em geral têm razões para estar preocupados com o resultado do referendo irresponsavelmente convocado pelo primeiro-ministro britânico, mais preocupados deveriam estar os próprios britânicos pelas consequências negativas da saída da União. Nenhuma análise séria augura algo de bom para o Reino Unido, a começar pela risco acrescido de independência da Escócia.

Empate

Esta previsão de apenas 1,2% para o crescimento económico no corrente ano é má, e vem na linha de outras até agora. Esta notícia sobre a aceleração da produção industrial é boa, e é uma surpresa.
Esperemos que a segunda leve a melhor sobre a primeira!

sábado, 11 de junho de 2016

Tiro no pé

Só por lapso é que o Primeiro-Ministro, falando em Paris, pode ter utilizado a noção de "coabitação" para caraterizar a situação política portuguesa no que respeita às relações do Governo com o Presidente da República.
Essa noção é típica do semipresidencialismo, caracterizado pelo sistema de governo "bicéfalo", em que a função governamental é compartilhada entre um PR governante e um primeiro-ministro responsável perante o parlamento. Não é esse o caso em Portugal, onde o PR não governa nem cogoverna e onde o governo chefiado pelo PM é o único responsável pela condução do governo do país, sendo exclusivamente responsável perante a AR. Em Portugal o PR não é chefe de uma "maioria presidencial" distinta da maioria parlamentar, mas sim o presidente de todos os portugueses.
Sempre contestei a leitura semipresidencialista do sistema de governo em Portugal, com bons argumentos constitucionais e políticos. Surpreende-me ver o próprio primeiro-ministro adotá-la. Um tiro no pé...

sexta-feira, 10 de junho de 2016

Sinais

1. Que a decisão sobre o modo de gestão dos transportes públicos urbanos de Lisboa e do Porto
seja tomada pela Assembleia da República
e não pelas assembleias municipais respetivas - e que seja um ministro a anunciar publicamente o traçado de uma linha de metro de Lisboa! - diz tudo sobre o défice de descentralização territorial em Portugal.
Do mesmo modo, que uma lei da República venha proibir a concessão dos transportes públicos de Lisboa e do Porto a empresas privadas (porque não de outras cidades?!) diz tudo sobre o peso político do PCP e da CGTP na atual solução governativa.

2. Nenhum desses sinais é positivo. Como defendo há décadas, os transportes públicos urbanos, incluindo os de Lisboa e do Porto, devem ser da competência das autoridades locais, que devem decidir livremente sobre o modo da sua gestão nos termos da lei geral (por serviço municipalizado, por empresa municipal, por empresa privada concessionada, etc.).
Claramente a herança da estatização dos transportes municipais de Lisboa e do Porto em 1975 está para lavar e durar! Quais princípios constitucionais da descentralização, da subsidiaridade e da autonomia do local, qual carapuça!

Reversão

A não ser que se se trate de uma evolução passageira, a notícia de que o rácio da dívida pública voltou a subir seria uma reversão assaz preocupante, não contribuindo para aliviar os custos da dívida nem muito menos para melhorar o atual rating das agências de notação.
A somar à degradação das mais recentes projeções (OCDE e BP) relativas ao crescimento, ao investimento, às exportações e ao défice orçamental, o mínimo que se pode dizer é que o horizonte das finanças públicas vai-se nublando. Demasiado!

quinta-feira, 9 de junho de 2016

E as fontes!?

1. Denunciei há meses a escandalosa impunidade das sistemáticas violações do segredo de justiça no "caso Sócrates" (e não só!).
Ao fim deste tempo todo, o MP veio anunciar a acusação de uma dúzia de jornalistas do grupo Correio da Manhã /Sábado por crime de violação do segredo de justiça. É uma noticia bem-vinda. Afinal, o Código Penal ainda está em vigor nessa parte!
Mas desconhece-se porque foram poupados outros media e sobretudo porque é que não há ninguém da própria acusação, que não pode deixar de ter responsabilidade na "filtragem" de dados para os jornais...

2. É claro que os habituais talibãs, argumentando em causa própria, vão denunciar o "intolerável atentado" à liberdade de imprensa. Mas num Estado de direito constitucional, nenhuma liberdade pode deixar de ser limitada pelos demais direitos e liberdades individuais e por outros valores constitucionalmente protegidos, como é o caso do segredo de Estado e do segredo de justiça.

Não aprender

É um erro grosseiro a decisão do Governo de isentar alguns troços das autoestradas A3 e A4 de portagens, revertendo a decisão do anterior Governo.
De facto, não se vê nenhuma razão para que os utentes daquelas autoestradas tenham o privilégio de ficarem isentos do princípio utilizador-pagador, ao contrário de todas as outras autoestradas do país.
Se é por causa da alegada má qualidade das alternativas rodoviárias a essas autoestradas, então muitas exceções haveriam de ser criadas, como por exemplo entre Aveiro e Coimbra ou entre Aveiro e Viseu.
Depois de há vinte anos ter incorrido em dois erros fatais nesta matéria, que ficaram muito caras ao País - ao isentar a CREL de portagens e ao criar as malfadadas SCUTs -,  o PS insiste em não aprender que (i) as finanças públicas não admitem autoestradas gratuitas e que (ii) a equidade territorial não é compatível com favores locais.

Mercados protegidos


Eis o lead da minha coluna semanal de hoje do Diário Económico digital. Pela abertura dos "mercados protegidos" das farmácias e dos táxis.

Adenda
Para evitar equívocos devo dizer que defendo publicamente a liberalização das farmácias desde sempre (por exemplo aqui) e que defendo a liberalização dos táxis desde pelo menos há oito anos (como recordo aqui e aqui), pelo que a minha posição não tem nada a ver com a recente polémica suscitada pela Uber.

Turquia - ataques à Democracia e ao Estado de direito

"Os atentados à Democracia e ao Estado de Direito na Turquia sucedem-se, tal como se sucedem os ataques terroristas, como o de ontem, em Instanbul, que inequivocamente condenamos. Uns e outros estão, desgraçadamente, ligados.

A retirada colectiva de imunidade a 138 deputados é uma indisfarçavel ofensiva contra o Grupo Parlamentar HDP. A brutal repressão sobre a minoria curda e sobre todos os críticos do projecto de poder pessoal do President Erdogan passa agora por esta grosseira violação dos critérios de Copenhaga, da Democracia e do Estado de direito. 

Entretanto, apesar do que hoje aqui disse o Comissário Hahn, Conselho e Comissao continuam a negar a realidade, a deixar-se chantagear, desvalorizando a  trágica regressão democrática na Turquia, repetindo absurdamente que é “país seguro”, que "praticamente" todos os critérios para a liberalização de vistos estão cumpridos e defendendo o "dirty deal" para "outsource" refugiados. 

Nesta trajectoria alucinada, em breve estaremos aqui a debater como responder à crise do afluxo de refugiados… turcos!"


(Minha intervenção em debate ontem no plenário do PE sobre a situação na Turquia)


quarta-feira, 8 de junho de 2016

Cambalhota

No Governo de Passos Coelho o CDS aprovou o corte de pensões em pagamento (que o TC vetou) e o corte de pensões a atribuir a partir de 1/1/2014 (10% nas pensões do setor público). Não há ocasião em que o CDS não defenda a necessidade de assegurar a sustentabilidade do sistema de pensões, o que previsivelmente vai exigir novos cortes no cálculo das pensões no futuro. O mais provável é que os atuais contribuintes venham a ter de trabalhar mais tempo para a pensão e a gozar de pensões mais reduzidas do que as que hoje as suas contribuições estão a financiar.
Pois é este mesmo partido que hipocritamente vem agora exigir que os contribuintes do sistema de pensões sejam informados sobre a expetativa do valor da sua futura pensão! Como se alguém pudesse garantir tal expetativa! É preciso ter lata! 

Zero de execução de Plano Juncker em Portugal!

"Zero de taxa de execução do EFSI (Fundo Europeu para o Investimento Estratégico - Plano Juncker) em Portugal!
Senhor Vice-Presidente Katainen - 
Haverá mais incisiva avaliação do impacto do EFSI para criar emprego, apoiar PMEs e projectos que promovam crescimento económico, e para corrigir desiquilibrios macroeconomicos na Europa, num país que Comissão e Conselho e o seu chefe "ex-machina", Dr. Schäuble, diziam até Novembro passado "estar no bom caminho", depois de ter sido submetido a um duro programa de austeridade vigiado pela Troika?
Se o EFSI pode funcionar e até estará a funcionar noutros países, então a responsabilidade pelo falhanço em Portugal é do anterior governo português, ultraliberal e mais troikista do que a Troika. E sua, Senhor Vice-Presidente Katainen, que manifestamente não cuidou da aplicação do Fundo em Portugal!
A acrescer à incapacidade do governo ultraliberal dos últimos quatro anos para usar o EFSI, os portugueses vêem agora o Eurogrupo e alguns comissários, como o Senhor Vice-Presidente, ameaçar Portugal com sanções pelo défice orçamental de 2015, engendrado pelas políticas desastrosas desse mesmo governo ultraliberal. Quer o Senhor Vice Presidente Katainen por todos os portugueses contra a União Europeia?"

Esta era a intervenção que escrevi para fazer no debate plenário no PE, esta manhã, sobre a aplicação do Plano Juncker para relançamento do investimento estratégico na UE. Mas não fiz, porque não me foi dada a palavra (num debate centrado nos membros da Comissão de Economia do PE). E não a posso mandar como "declaração escrita" para as actas do debate, porque cada MEP só tem direito a uma por sessão plenária e eu já exerci esse direito. Enfim, aqui fica! Para registo e à espera de próxima oportunidade de confrontar o Vice-Presidente finlandês.

Partilha e gestão de bases de dados para combater criminalidade, incluindo terrorismo

"Os atentados de Paris e de Bruxelas demonstram que precisamos de mais Europa para defender a nossa segurança e provam a interdependência entre segurança interna e externa. Combater o terrorismo e outras formas de criminalidade organizada é prioridade que nenhum Estado-Membro pode prosseguir sozinho: impõe partilha de capacidades, em especial na "intelligence", na justiça e na polícia, incluindo a polícia de fronteira e autoridade alfandegária.  Só assim conseguiremos cumprir os objetivos da Agenda para a Segurança, nos seus vários níveis: cooperação entre Estados-Membros, cooperação entre autoridades nacionais e as diferentes Agências da UE, cooperação a nível operacional, formação e exercício conjunto, o que exige financiamento adequado.

Hoje temos em vigor um quadro legislativo europeu para a proteção de dados que permite uma partilha de dados mais segura entre autoridades policiais e judiciais, que assim podem cooperar de forma eficaz para combater o crime e, especificamente, o terrorismo. Um quadro que, assegurando respeito pelos direitos fundamentais, e pelos principios da limitação da finalidade e da proporcionalidade, permite eliminar bloqueios e falhas na arquitectura do controle e gestão de dados e combater a fragmentação, incluindo a sentida na segurança e controlo de fronteiras. Um quadro que cria e regula as condições para ser agilizada a interoperabilidade entre bases de dados das forças de segurança a nível interno em cada Estado Membro e no plano europeu. E que impõe que em cada Estado Membro e em conjunto trabalhemos para eliminar deficiências nas funcionalidades dos sistemas existentes - e, portanto, no alcance e eficácia da necessária interoperabilidade. 

Por outro lado, no mês passado, este Parlamento aprovou o novo regulamento da EUROPOL, que determina o reforço do controlo democrático da cooperação policial, a exercer pelo Parlamento Europeu em associação com os parlamentos nacionais. Queremos ser mais eficazes na luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo. O que tem faltado é vontade política por parte dos Estados Membros para que os seus agentes se empenhem na utilização dos mecanismos europeus existentes. Cabe aos Governos impelir para a cooperação  europeia serviços de informação, polícias e instâncias judiciárias, que precisam de ter meios e capacidades reforçadas e não continuar a ser asfixiados por constrangimentos orçamentais.

Os ataques terroristas em Paris e Bruxelas demonstram como pagamos caro, e em vidas, a fragmentação, a desconfiança, a desunião. Para teremos mais Europa na seguranca e defesa dos cidadãos, incluindo na defesa das liberdade fundamentais, precisamos também de nos livrar das políticas neoliberais que, fomentando desemprego, exclusão social e discriminação, alimentam o ressentimento de tantos jovens europeus que se juntam às fileiras do Daesh, muitos depois de se radicalizarem sozinhos, online. O terrorismo não vem de fora, não nos iludemos a chamar-lhes "foreign fighters", nem a acusar refugiados e migrantes. O Conselho Europeu tem de  assumir as suas responsabilidades e acabar com políticas austeritarias desastrosas que só trazem insegurança aos europeus e inflamam forças extremistas anti-UE e anti-democracia".


Intervenção que fiz (mas que tive de cortar por exceder os 2 minutos que me foram dados) no debate plenário do PE, hoje, sobre gestão de bases de dados no combate ao terrorismo e criminalidade organizada.

 

Conivência de governos europeus no programa de tortura da CIA

"European Court of Human Rights judgements passed in the cases Al Nashiri and Abu Zubaydah vs Poland, and pending respectively versus Romania and Lithuania, and the Nasr and Ghali vs Italy, plus Al Masri vs FYROM, judicial decisions in the UK in favor of victims of torture, all prove that European governments lied to this Parliament to callously cover up active complicity with the CIA extraordinary renditions/torture program. Worse, their cooperation was payed with large sums of money, as the U.S. Senate Intelligence Committee of December 2015 reveals.

Worse even: Impunity has been granted by EU States to those responsible for these crimes. In Italy, for instance, "state secrecy" was used to block the judiciary and as a result, innocent low level officers were convicted while top culprits are protected: Italy wants now to put in jail Portuguese-American Sabrina de Sousa, a former CIA officer who was tried in absentia and never given the chance to prove her denial of any involvement. Even the victim of torture and kidnapping in that case, Mr. Abu Omar, the imam of Milan, has stated that she is but a scapegoat.

In my country, Portugal, all cover up efforts were made to protect Mr. Durão Barroso, who as Prime Minister abetted the CIA renditions program, as I reported in detail to the General Public Prosecutor - the case was closed to spare the, in the meantime, made President of the European Commission.

How can the European Union be credible in the eyes of its citizens and the world and effectively fight terrorism, if European States behave in this criminal way and actually play into the hands and propaganda of terrorists?

Also I will never, ever, let this investigation go without accountability happening."


Minha intervenção ontem, no debate plenário do PE sobre o seguimento do inquérito sobre a cumplicidade de governos europeus com o programa de "extraordinary renditions"/tortura da CIA.

 

Leviandade

«Os tratados exigem-nos que tenhamos o défice abaixo de 3% e o que estamos a discutir é se esse défice é de 2,2%, 2,3% ou 2,5%. Para o país qual é a diferença de ter um défice de 2,2% ou 2,7%?»
Esta passagem da entrevista da deputada do BE, Mariana Mortágua, ao DN mostra a compulsiva leviandade política do Bloco.
Primeiro, a UE não exige somente um défice nominal abaixo dos 3% do PIB; quer também a redução continuada do défice estrutural para 0,5%, o que na atual situação da economia supõe um défice nominal bem abaixo dos 3%.
Segundo, a diferença entre um défice orçamental de 2,2% e de 2,7% [a OCDE já fala em 2,9%!] está entre o Governo cumprir ou falhar os seus compromissos orçamentais, com o crédito ou descrédito político que vai associado a cada uma dessas opções.
Terceiro, e mais importante, a diferença essencial entre uma e outra meta do défice está em pelo menos uns 700 milhões de dívida pública adicional em cima da montanha que o País já tem, falhando o compromisso de redução da dívida pública e agravando a dependência externa do País e as condições de acesso ao financiamento externo.
Que ideias destas possam ser defendidas por quem defende a "reestruturação da dívida" e o "calote" aos credores, pode entender-se. O problema é se tais ideias encontram eco também dentro do PS...

terça-feira, 7 de junho de 2016

Sobre o "compacto migrações" tirado da cartola na UE...

"Mil mortos só na semana passada no Mediterrâneo: pelo falhanço em responder à crise humanitária que há muito vimos vir, percebe-se que Conselho e Comissão não têm ideias nem sobre como lidar com as causas, nem para enfrentar as consequências, apostando em replicar com outros o imoral negócio de "outsourcing" feito com a Turquia.  E assim continuam a dar negócio aos traficantes não abrindo vias legais e seguras de acesso a quem pede protecção, tal como se demitem de explicar aos europeus que os fluxos de migrantes e refugiados, se bem geridos, podem ajudar a travar o envelhecimento da Europa. E não avançam sequer para criar  instrumentos para financiar a integração de refugiados e migrantes.
Tratar África “one-size-fits-all” é erro grosseiro. Vários dos regimes tidos como parceiros são causadores da opressão e da miséria de que fogem refugiados e migrantes: fabricam-nos.
Um Plano Marshall para Africa deve começar por parar a austeridade destruidora de emprego na própria União. Mas, sem duvida, precisamos de uma resposta política estratégica: ela implica que os governos europeus parem de acolher fluxos ilicitos de capitais que elites cleptocratas desviam dos recursos dos seus povos e Estados. Parem de sustentar regimes opressivos, como os do Egipto, Sudões, Etiopia, Eritreia, entre outros que reuniram na Conferência de La Valetta. E parem de desperdiçar a União para agir coordenadamente nos quadros PESC e PCSD a fim de resolver conflitos, combater terrorismo e criminalidade organizada, reforçar a "rule of the law" e promover o desenvolvimento sustentável em África, na vizinhança e além delas."


Declaração que não pude fazer, mas enviei por escrito, para debate sobre "migration compact" no PE, esta tarde.

Inconstitucionalidade

1. Creio que não faz muito sentido invocar a "lei travão orçamental" (que proíbe iniciativas legislativas dos deputados que aumentem a despesa prevista no orçamento do ano em curso) contra a redução do tempo de trabalho semanal dos funcionários públicos para as 35 horas, por dois motivos: (i) o previsível aumento da despesa pública não resulta direta e automaticamente da redução do horário, podendo este ser feito teoricamente à custa do desempenho do serviços; (ii) a "lei travão" existe para proteger o Governo contra a irresponsabilidade orçamental dos deputados; ora neste caso o Governo não só não se opõe como apoia!

2. Para além das objeções políticas contra as 35 horas, as objeções de constitucionalidade só poderiam derivar da eventual infracção do princípio da igualdade, dada a discriminação que se cria em relação aos trabalhadores do setor privado e, mesmo dentro do setor público, a discriminação contra os trabalhadores com contrato de trabalho de direito laboral comum, que não são abrangidos pela redução.
Quando se trata de princípios constitucionais, as questões de constitucionalidade não são liquidas. Mas sabe-se a especial sensibilidade do TC à questão da igualdade de tratamento entre os trabalhadores do setor público e os do privado, que levou o Tribunal a declarar a inconstitucionalidade de cortes de remuneração que só afetavam os primeiros. A questão da desigualdade é previsivelmente mais sensível quando afeta trabalhadores sujeitos à mesma entidade empregadora.

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Amanhã vou estar aqui


Primeira de uma série de conferências sobre os quarenta anos da CRP.

Laicidade


Este é o lead da minha coluna da semana passada no Diário Económico. O Estado tem uma obrigação constitucional de respeitar e fazer respeitar a liberdade religiosa das pessoas, mas não tem de financiar as religiões. E num Estado laico não deve. Cabe aos crentes fazê-lo.

Congresso (3)

Ensina a arte bélica que exércitos animicamente mobilizados e confiantes nos seus generais lutam mais empenhadamente e têm mais condições de êxito. O mesmo vale no campo da luta política.
António Costa mostrou mais uma vez a sua mestria em "puxar" pela confiança dos militantes no partido e no Governo. Não há líderes sem essa qualidade.
Compreensivelmente, os motivos de preocupação provindos da frente económica e orçamental ficaram nos bastidores...

Congresso (2)

Segundo Pacheco Pereira, convidado no Congresso, não há condições de realização de políticas de esquerda enquanto se mantiver em vigor o Tratado Orçamental, que veio apertar os critérios da disciplina orçamental e de controlo do endividamento público na zona euro. Rezam as crónicas que foi muito aplaudido quando defendeu que o PS devia "rasgar" tal tratado.
O problema é que o respeito do Tratado Orçamental não pode ser considerado nem esquerda nem de direita, sendo condição de manutenção da moeda comum. De resto, a meu ver, o maior ultraje que se pode fazer às políticas de esquerda é aceitar que elas só são financiáveis através do défice e da dívida.

Congresso

Foi quase unanimemente ratificada a aliança do PS com a extrema-esquerda parlamentar, como se ela não fosse a base parlamentar de uma solução de governo conjuntural e tivesse vocação de continuidade para além dele.
Com isso foi substancialmente alterado o xadrez político nacional e a posição do PS nele. Em vez da tradicional trilogia direita-PS-esquerda de protesto, com um PS tão distante (ou mais) da segunda quanto da primeira, passamos a ter uma bipolarização direita-esquerda, com o PS a liderar o bloco à esquerda.
Resta saber se a aliança de esquerda tem pés para andar depois da "geringonça" e se, alinhado à esquerda, o PS mantém a capacidade de atração do centro sociológico, que dita as vitórias eleitorais..

Adenda
O PS deveria agradecer a Francisco Assis a quebra da unanimidade celebratória da aliança do PS à esquerda. Receio bem que no dia em que o PS perder o seu pilar social-democrata liberal, perderá também a sua condição estrutural de partido de governo, que nunca deixou de ser nestas quatro décadas de democracia.

sábado, 4 de junho de 2016

Desafios socialistas para Portugal e para a Europa


Minha intervenção no XXI Congresso do PS, esta tarde:

"Mil milhões de euros - que folga não nos dariam no défice face ao famigerado Pacto Orçamental? no alívio das famílias da classe média sobrecarregadas de impostos? e das PMEs, que em Portugal e na UE pagam mais 30% de impostos, em média, do que as grandes multinacionais?
Mas mais de mil milhões de euros foram desbaratados só em 2015, quando o Governo Coelho/Portas deu isenções e benefícios fiscais, em total opacidade, a certas empresas, muitas de fachada para encobrir esquemas de corrupção e criminalidade, nacional e estrangeira, abrigados em jurisdições offshore. Não havia dinheiro, diziam Direita e Troika para justificar a austeridade cega com que brutalmente impuseram cortes nos salários, pensões e serviços públicos e sobrecarregaram de impostos quem trabalha. Pois não havia dinheiro porque ele se acumulava - acumula - nas offshores!
É preciso que nós, socialistas, tenhamos consciência de que, contando com transferências de lucros, dividendos e investimentos de carteira, foram saindo de Portugal, ano após ano, subtraindo recursos ao Estado, montantes astronómicos - nos ultimos quinze anos totalizando porventura mais do que a dívida pública nacional, que a Direita no poder só fez aumentar.
O PS, agora no Governo, tem de agir para travar a indústria de escroques que, dominando a banca, consultoras financeiras, escritórios de advocacia, etc., vivem de procurar capturar a governação para organizar esse desvio de recursos, legal e ilegalmente, para paraísos fiscais como Holanda, Luxemburgo, Panamá, Hong Kong, Bahamas, etc... 
Como aqui hoje frisou o Martin Schulz, é preciso pressionarmos para serem aplicadas por Comissão Europeia, Conselho e Estados Membros as medidas propostas pelo Parlamento europeu depois de ter inquirido sobre os chamados "Luxleaks", inquérito que vai prosseguir aos chamados "Panamá Papers". Para que sectores financeiros, imobiliários e empresariais, nacionais e europeus, não continuem a ser verdadeiros agentes, não apenas de desvio das receitas dos Estados à conta dos impostos dos contribuintes, mas também de lavagem e reciclagem dos recursos roubados a outros povos, por cleptocratas e corruptos, sejam angolanos, russos, chineses, brasileiros ou outros. Não se trata apenas de assegurar justiça fiscal: é a democracia e a integridade da governação que estão em causa.
Sem fazer tudo para recuperar esses recursos e os mobilizar para relançar investimento público e privado e o emprego, os cidadãos não vão voltar a acreditar nos governos e nas instituições europeias. E cada vez mais veremos crescer perigosos movimentos populistas, nacionalistas e extremistas, que louvam Brexits e ditaduras, levantam fronteiras e impelem governantes fracos a fazer indecentes negócios, como o aprovado pelo Conselho Europeu com a Turquia para empurrar  refugiados e migrantes, que desumanamente deixamos atacar e afogar.  E é neste quadro que um país que cumpre as suas obrigações de solidariedade, como Portugal pela mão do governo do PS, se torna exemplo excepcional - como destacou o Presidente do PE. Diz muito, isto, do triste estado a que chegou a nossa Europa.
Mas não podemos baixar os braços: para regular o mundo globalizado e em descontrolada transformação pela evolução tecnológica, precisamos de governação a nível europeu. Face a ameaças e desafios cada vez mais transnacionais, incluindo à nossa segurança, como a ameaça terrorista demonstra, precisamos absolutamente de mais solidariedade e cooperação europeias: é tempo de avançar para uma Europa federal, com soberania partilhada, mas com mais democracia e transparência, porque só assim terá autoridade e capacidade regulatória. Se aceitarmos continuar sob a batuta de uma "Grosse Koalition" em que a social democracia se desacredita, com uma  preconceituosa, impositiva, sem principios e sem estratégia, veremos a Europa, com ou sem Brexit, fragmentar-se e enfraquecer. E da actual insegurança não tardaremos a resvalar para a guerra. 
Não o queremos. Por isso é que temos de continuar a trabalhar para fazer funcionar a "geringonça", mas também precisamos que o Governo português se bata no Conselho Europeu, e na nossa própria família política socialista europeia, por uma agenda de esquerda.  Pela integração política, o emprego, progresso econômico, justiça fiscal, Estado social e respeito pelos valores e princípios europeus, em especial os direitos humanos. Para combater a austeridade destrutiva da direita neo-liberal e os ventos xenófobos e violentos que ela semeia. Para voltar a dar esperança e confiança aos povos europeus, como já as estamos devolver aos portugueses.

Viva o PS!
Viva Portugal! 
Por uma Europa Unida ao serviço dos cidadãos!"

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Democracia participativa

1. Neste interessante debate aqui relatado pelo Público sobre o ensaio da democracia participativa protagonizado pela "Carta Constitucional de Coimbra" aprovada há 15 anos - em cuja redação me envolvi -, o principal fator em que insisti para explicar o seu insucesso, a par da inamistosidade do poder municipal de Coimbra, foi o erro de conceção que consistiu em tentar institucionalizar algo que resiste à institucionalização e que é por natureza descontinuo e fragmentário, vivendo de causas e de momentos propícios, como é participação cívica no poder local.

2. Como mostram os exemplos noutras paragens, incluindo em Portugal, as experiências de democracia participativa mais bem sucedidas giram à volta de um número contado de temas e de mecanismos, como o orçamento participativo, a convocação de referendos locais, a resposta a consultas públicas lançadas pelo município, os observatórios cívicos setoriais (cultura, ambiente, transportes públicos, habitação social, etc.), os painéis ou júris cívicos destinados a debater e "julgar" as iniciativas ou políticas municipais mais críticas (reordenamento urbanístico, grandes obras públicas, etc.).

Imperialismo


Por descuido só hoje registo aqui no Causa Nossa, como habitualmente, a minha coluna no Diário Económico da semana passada. Ou como o imperialismo da liberdade de expressão sacrifica abusivamente outros direitos fundamentais não menos importantes, como o direito à honra e ao bom nome.