quinta-feira, 11 de dezembro de 2003

Ainda sobre a lusofonia

Algumas coisas devem ser ditas (blogando):
1. O colonialismo era horrível (algo que o "povo" quando interrogado calmamente diz, xibalo aqui por exemplo, a pancada, o desprezo, etc e tal. Isso, caro Luís Nazaré, não se esquece, ainda para mais quando se tem a idade da Cesária Évora) e é claro que deixa marcas;
2. o português em África, hoje, oscila entre o paternalista (sumamente irritante) e o arrogante (racista, quantas vezes de modo inconsciente), o que exponencia as marcas. E falo do emigrante (eu próprio) e a do enviado estatal/societal. Nem todos o somos, mas uma boa mão cheia deles (cá e daí vindos) fazem a imagem;
3. a lusofonia da III República é uma ideologia falha e procura limpar o passado, como se não houvesse memória, história, assim desvalorizando os povos alheios, exactamente porque sem história, sem memória (vejam o Margarido, o Lourenço e, já agora, o Cahen, e digo-o sem laivos de erudição, talvez conheçam V. outros, que desmontam o discurso de modo implacável), o que piora os ressentimentos [que se passou com a esquerda no poder que nada mais fez do que reproduzir isto? que falha histórica! sublinho, a esquerda no poder, mas que impregnou tantos outros, sem capacidade de se afastarem do mainstream. A analisar segundo uma sociologia da intelectualidade? Tantos fundos, tantos encontros, tantos congressos para a lusofonia? E ela tão mal acolhida, porque será, só pela má-disposição alheia? Ou não será uma enorme falha intelectual? Caramba, e é tão óbvio, basta olhar e ver]
4. E, mais do que tudo, Portugal falhou no regresso a África, um regresso diferente, de negócios de mercado aberto (é falso, os mercados estão controlados, nós sabemos, mas entendam, digo que já não é mercado fechado colonial, é isso que eu quero dizer: em Coimbra Carlos Fortuna é bom exemplo de alguém que escreveu sobre isso), e falhou na cooperação para o desenvolvimento. Sempre confiantes nessa falsa e maldita vantagem comparativa, aquela que julgam ser a da língua comum: mais que não seja (porque ela ainda implica mais ruídos) porque não chega, não é só por si competente.
5. E ainda, e termino, mas tanto haverá para dizer. A maioria da população já não viveu o colonialismo, só conhece os portugueses do que ouvem dizer, pelos seus mais velhos, e por aquilo que nós mostramos. E, Luís Nazaré, como há-de alguém de simpatizar connosco se só conhece de nós o que nós mostramos em África? (tem TVCabo? Dedique antes do próximo post um dia à RTP-África. Garanto-lhe que ficará ferozmente anti-tuga)
Fico, atabalhoado, por aqui. Mas se houve vontade de "regressar a África" nos anos 90 falhou. E hoje dizem-me que em Angola cooperação e empresas fazem exactamente os mesmos erros que em Moçambique se fizeram na década passada. E, pior, se houve (há) vontade para contribuir para o desenvolvimento alheio, aí é mesmo no comments...

Mas antes, MMLM, concordo com essa negação da ideia de que o nosso colonialismo é pior do que os outros. Não tem qualquer razão de ser esse pensamento. Nem empírica nem conceptual. E, talvez, as relações actuais também não sejam piores do que a que os outros ex-colonos têm nas suas colónias. Mas podiam ser muito melhores, a bem comum. Se houvesse mais inteligência, mais olhar e menos vaidade.

José Pimentel Teixeira